Missões Jesuíticas/Guarani completam 400 anos em 2026

Conheça um pouco mais sobre essa civilização

Consideradas Patrimônio Mundial da Humanidade pela Unesco, as missões jesuíticas/Guarani estão distribuídas ao longo de um território que hoje abrange partes do Brasil, Argentina e Paraguai. Ainda hoje – 400 anos depois da chegada dos jusuítas ao solo gaúcho – a região das Missões é considerada um dos principais polos de identidade cultural do Rio Grande do Sul. As muitas comemorações previstas, lançadas nessa semana, pelo governo do Estado e municípios, para marcar os 400 anos da chegada dos missionários na região, irão envolver todos os setores, com destaque ao turismo e cultura. A expectativa é aumentar o fluxo de visitantes para a região, apoiando o desenvolvimento. A data máxima do evento será em 03 de maio de 2026, mas a programação transcorrera durante todo o ano.

Esta Terra Tem dono!

         Há farta literatura sobre a formação e declínio das Missões. Diversos escritores – gaúchos, platinos, brasileiros e europeus – escreveram sobre as Missões e sua importância para a formação do povo gaúcho.

As cartas do Pe Sepp pediam apoio com o envio de partituras aos músicos indígenas

Alguns, como o pesquisador, folclorista João Carlos Paixão Cortes, fez apontamentos das correspondências trocadas entre padres (padre Sepp 1710) que das missões enviavam informações e pedidos aos superiores na Espanha para que enviassem as vésperas breves, breviares e brevíssimas, para auxiliar na educação musical. Padre Sepp pedia “em nome de todos aqueles pobres músicos indígenas, os quais, se reunir aos de todas as reduções, soma, uns 3.000 homens”. Vale a pena ver esses escritos no livro Folclore Gaúcho -Festas, bailes, música e religiosidade rural.

São miguel das missões, um preciosidade

Alcy Cheuiche, um escritor de renome internacional, já foi Patrono da Feira do Livro de Porto Alegre, tem vasta obra sobre as missões. O livro Sapé Tiaraju –Romance dos Sete Povos das Missões, foi produzido com o fotógrafo Leonid Streliaev e prefácio do suíço Clóvis Lugon.

A saga missioneira é uma obra de arte

A obra bilingue (Português/Alemão), feita com apoio da Lei de Incentivo à Cultura, editora AGE, dedicada aos 190 anos da imigração alemã no Brasil, é magnífica. O grito “Essa Terra tem Dono /Co Yvy oguereco Yara ou Dieses Land hat Einen Besitzer permanece na mente do leitor, mesmo depois de muitos dias da leitura. Da mesma forma, Cheuiche produziu, através das suas oficinas literárias, esta dedicada aos 80 anos do Sindicato dos Bancários de Porto Alegre, o livro de contos em Português, Espanhol e Guarani, intitulado Esta Terra tem Dono.  A obra lançada na época da instalação do Mercosul é – sem dúvida – extraordinária! Editada pela RGE!. Mas antes desses romances, Cheiuche escreveu uma peça muito linda: “O Mestiço de São Borja”, bota livro/romance bom nisso. Foi lançado em julho de 1983 na XXI Convenção Tradicionalista, em Lagoa Vermelha. Na oportunidade, divulguei o lançamento/debate, na página Tradicionalismo, assinada por mim em Folha da Tarde.

Aqui a primeira edição dos versos do maior Pajador de todos os tempos por essas plagas

E foi na Folha da Tarde que conheci e tive a honra de acompanhar parte da trajetória do maior pajador riograndense, o grande Jayme Caetano Braun. No livro “De Fogão em Fogão”, primeira edição em 1958, pela Coleção 3 Chirus, esse gênio definiu as missões assim, no primeiro de 10 versos: Surgido assim como um duende/destes campos e faxinas/por entre o meio das ruinas/que o tempo jamais apaga/xucro que nem fio de adaga/revoluteando aos corcovos/sou cria dos Sete Povos/ nascido em São Luís Gonzaga”.  Jayme Caetano Braun teve seu velório realizado no Palácio Piratini, a pedido do governador, à época, o também missioneiro Olívio Dutra.

É importante destacar, naturalmente, a obra do padre Clóvis Lugon, o livro A república comunista cristã dos guaranis (Rio de Janeiro. Paz e Terra, 1968). Padre suíço, já falecido, se dedicou ao estudo das Missões Jesuíticas da América Latina. Tem muitas outras obras.

Nessa obra Barbosa Lessa é professoral, é analista e define as Missões

Em Rodeio dos Ventos o grande e saudoso Barbosa Lessa, também foi Patrono da Feira do Livro, descreveu a formação do Rio Grande do Sul de forma mágica. Nesse pequeno livro (tamanho de bolso), com 210 páginas, tem um pouco de tudo, com grande quantidade de histórias e causos das Missões. Porém o capitulo que descreve o nascimento da indiazinha Anaí (que depois acabou no cinema, no filme Anaí das Missões) e depois trata da sua vida adulta, é um ensinamento que fica para sempre. Dados do dia a dia e documentos provando todos os acontecimentos, a miséria a que foram reduzidos os moradores das ruinas, foram descritos de forma objetiva.  O mesmo sobre o ocorrido na Batalha de Ituçaingô/Rosário quando as mulheres todas (cunhãs, chinas e de outras etnias), usando a flor da corticeira em seus cabelos, acabaram com uma guerra. Tá na obra a documentação toda.

missões - ruínas históricas
As muitas imagens sacras produzidas pelos povos missioneiros, nos seus tempos de guerras e paz

A mboi-guaçu de São Miguel. Nesse conto Lessa começa assim: Quem me falou da mboi-guaçu foi Sebastiana Gonçalves de Oliveira, mestiça guarani, 97 anos de idade, que em julho de 1951 ainda morava em seu rancho perto das ruínas de São Miguel, ex-capital das Missões. E falou assim……… Outro livro de Barbosa Lessa “São Miguel da Humanidade- Uma proposição Antropológica”, o trabalho de Lessa é uma análise com informações de como as missões e reduções foram concebidas, como e por quais inimigos foram atacadas e as muitas lutas para a defesa.

Dentro dessas paredes pode estar a Cobra Grande, a Mboi Guaçu, cujos restos

O escritor e pesquisador missioneiro José Roberto de Oliveira não pode ficar fora da lista de escritores que precisam ser lidos para melhor conhecimento das missões. Professor e um entusiasta sobre a potencialidade da sua região, nos legou com grande capacidade algumas obras (não conheço todas, cito apenas as que conheço) muito importantes: Pedido de Perdão ao Triunfo da Humanidade, edição Martins Livreiro; o livro “Relatório da Guerra Guaranítica”, publicado em 2020, apresenta documentos , muitos inéditos, uma sobre a Guerra Guaranítica (1754-1756) e, ainda, “M’Bororé a Batalha” (2021), quando em 1641 os guaranis derrotaram uma “bandeira” paulista que buscava acabar com o trabalho nas Missões, matando ou mandando os padres de volta à Europa e escravizando os indígenas.

O poeta, compositor e escritor José Machado Leal também viajou na sua obra Missões – A República do Boi, na qual exalta a luta do guerreiro Nicolau Nhenguiru, um líder indígena guarani, contemporâneo e, quem sabe, tio de Sepé Tiaraju, e teve um papel importante na Guerra Guaranítica. No livro lançado pela Riegel, Leal adentra América Latina, com os seus personagens. Um romance muito bom.

Não dá para deixar de falar nas benzedeiras das Missões, afinal de contas elas já se mostraram no Festival Internacional de Turismo, em Gramado, a mais importante Feira de Turismo da América Latina. Naquela vitrine pra o mundo, as benzedeiras atraíram a atenção do público e dos agentes e operadores de viagens. No recente livro lançado pela editora Bá,

Tenondé Park Hotel e ruínas das Missões ao fundo

A História Perdida das Benzedeiras gaúchas (obra produzida com apoio da Lei Rouanet, BRDE, Amberflex e realizada pelo Governo Federal) o premiado jornalista Carlos Wagner adentra missões afora, conversando com muitas benzedeiras, inclusive dona Alzira que já me benzeu no Festuris e em sua residência em São Miguel, ocasião em que fomos numa cruzada de observação de aves, com os companheiros observadores das Missões e região. Ficamos no Tenondé Park Hotel , bem ao lado do complexo das ruínas e, enquanto um dos grupos foi às florestas, buscando observar aves, alguns foram em busca de uma benzedeira.

Gilberto Sander Müller, Jurema Josefa e Dante Meller

Na oportunidade, o escritor e biólogo missioneiro Dante Meller, autografou sua obra sobre aves da região e do RS. Da mesma forma, a exposição de águias missioneiras do proprietário do hotel (um apaixonado por águias e aves em geral ) contribuíram para o sucesso da “saída” de observação do Clube de Observadores de Aves de Porto Alegre (COA/POA) que se deslocaram mais de 600 quilômetros para a atividade!

Portanto, temos já, com isso, três atrativos turístico: Dois religiosos ou espirituais (as igrejas e as benzedeiras) e a observação de aves. Num dos capítulos Wagner conta sobre sua busca por benzedeiras na região, apoiando pelo historiador José Roberto de Oliveira.

Jurema J Silva

Jornalista profissional, trabalhou nos principais jornais de Porto Alegre e Rio Grande do Sul. Prestou assessoria às entidades ABAV, Sindetur, Sindicato de Hotéis no RS e à Confederação das Organizações de Turismo da América Latina (Cotal). Atualmente atua com assessoria de imprensa na Câmara Municipal de Porto Alegre.

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