São Miguel: A Capital Missioneira fala de índios, santos, guerras e heróis

Chegada perto de São Miguel das Missões

Chegada perto de São Miguel das Missões e lavouras de soja

A Placa indica que a chegada à Capital dos Sete Povos das Missões, está próxima. Em seguida, o pórtico de São Miguel das Missões, na rodovia RS 536, dá as boas vindas aos visitantes e avisa:

Pórtico de São Miguel

Pórtico de São Miguel

Co Yvy Oguereco Yara – que traduzida do Guarani para o Português representa “esta terra tem dono“, reproduzindo a fala do índio guerreiro, herói e mártir que cresceu com o sinal dos “grandes” na testa, que enfrentou com denodo dois exércitos bem treinados e muito bem armados, cuja finalidade era definir uma fronteira, levando por diante quem estivesse no meio ou – no caso – quem tivesse ideais. No começo do ano de 1756, exatamente no dia 07 de fevereiro de 1756, junto com sua tribo e com um grupo de padres Jesuítas, Sepé Tiaraju foi morto numa das mais sangrentas batalhas da Guerra Guaranítica. A Nação Guarani deixou de existir, mas Sepé renasceu como herói e a região dos Sete Povos das Missões – parte dos 30 povos que povoaram uma região que abrange parte da Argentina, do Paraguai e do Brasil, no Rio Grande do Sul – é nos dias atuais um pedaço da história da humanidade, demonstrando a forma como o cristianismo prosperou nas terras dos pampas.

Mesmo antes de chegar ao pórtico da entrada de São Miguel, que foi decorado com esculturas representando São Miguel Arcanjo, homens, mulheres e crianças da Nação Guarani, mais o Padre Jesuíta Cristóvão de Mendonza e Sepé Tiaraju, placas indicam os sítios de outras reduções.  São muitas as atrações em toda a região missioneira que abriga os sete povos, com as reduções de São Francisco de Borja, São Nicolau, São Miguel Arcanjo, São Lourenço Mártir, São João Batista, São Luiz Gonzaga e Santo Ângelo Custódio. A Capital, São Miguel Arcanjo, distante cerca de 480 da capital do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, tem muitas atrações que contam a história de dias de glórias e de muitas lutas do povo guarani. A visita ao Parque das Ruínas de São Miguel, ou Sítio Histórico de São Miguel Arcanjo – que por seu valor histórico, arquitetônico e cultural, foi tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) em 1938, foi declarado Patrimônio Mundial pelo UNESCO em 1983 – é uma atividade mística. A cada pedra ainda meio sepultada no chão, junto às paredes muito largas, tem um pedaço na história encravada em símbolos que foram esculpidos pelos indígenas, como conta a história.

Após estudos por equipes do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) reconheceram a “Tava”, (lugar de referência para o povo guarani) e registraram o nome como patrimônio cultural imaterial brasileiro. Ou seja, impossível negar que ali foi moradia, abrigo e ponto de referência da cultura desse povo que construiu não somente os prédios que serviram como moradia, escola e templos e que deixaram as marcas exaltando suas divindades, como Nhanderu, seu mais elevado guia/comandante. Muitas outras Tavas existem na rota das missões, incluindo o Uruguai, concluíram pesquisadores do IPHAN, porém nenhuma tem, apesar de tantos anos, o esplendor e a grandiosidade de São Miguel.

ruínas de são miguel

Parte interna da antiga igreja

Esse esplendor todo compreende um conjunto de ruínas da antiga redução de São Miguel Arcanjo, um dos mais significativos vestígios do período das Missões Jesuíticas dos Guaranis em todo o mundo. A construção é do século XVIII, entre 1735 e 1745. A Igreja – nos dias atuais ainda mantem a separação da nave principal, cujo chão está todo gramado, levando o visitante até o fundo, onde se localizava o altar, numa caminhada bem emocionante. As naves laterais contam com aberturas onde se pode ver a largura de mais ou menos um metro. O templo foi projetado pelo padre italiano João Batista Primolli e construída inteiramente em pedra grês. Não foi finalizada, pois faltou ser construída a segunda torre, que seria o observatório astronômico. A outra torre está ali, meio torta, mas de pé. O teto da igreja é o céu, ou firmamento, onde nas noites claras pode-se ver Jacy (a Lua) passeando entre as estrelas.

São Miguel

Vista interna da igreja

A Sacristia da Igreja, que foi bastante atingida pelo tornado em 2016, foi reconstruída e ali está disposta uma maquete para dar uma noção de como funcionavam as coisas no tempo de ouro das Missões. Logo na Entrada a Cruz de Caravaca, ao lado do prédio do Museu (uma construção contemporânea), adiante a Catedral, casas de ensino, de artes, de hospedagem, as casas dos moradores índios, o ponto de captação de água, as oficinais de arte, música. A casa das viúvas, ou Cotiguaçu, onde essas mulheres cuidavam dos órfãos. A Fonte Missioneira (essa um pouco distante do complexo), onde pelas ruínas pode-se deduzir que serviam para fornecer água potável e local para banho logo abaixo. Tem ainda locais de estrebaria e outros. Claro que um cemitério integra o complexo.

Povo indígena oferece objetos de artesanato

Povo indígena oferece objetos de artesanato junto ao museu

antigo sino em São Miguel

No Museu das Missões projetado pelo Arquiteto Lúcio Costa e foi construído em 1940, está disposta uma das mais ricas coleções de arte sacra missioneira dos séculos XVII a XVIII. Como o Museu está dentro do Sítio de São Miguel, na entrada, é bom ver como está a temperatura, pois em dias muito quentes o ideal será visitar o museu enquanto o sol está alto, e vice-versa.

Visite o Ponto de Memória Missioneira em São Miguel

Valtinha em São Miguel

Valter Braga, junto à uma réplica

Para prosseguir numa visita a cidade de São Miguel, é preciso visitar o Ponto de Memória Missioneira, bem na área central, mas próximo do Sítio Histórico. Ali, numa casa de esquina, na rua Arnaldo Daher Boays, 514 o organizador e coordenador, Valter Braga (conhecido como Valtinha) apresenta os inúmeros objetos, utensílios utilizados por índios e por outras etnias que ajudaram a fundar a chamada “alma missioneira”, como imigrantes europeus. Conhecedor dos costumes e da historia da comunidade Mbyá-Guarani, Valtinha encena aos visitantes alguns rituais, como os tipos de mensagens de fogo transmitidos pelos índios nas reduções. Os Jesuítas teriam se beneficiado com esse conhecimento, pois podiam através dos “entendidos” dar sinais de ataque, de doenças, de pedidos de socorro de uma para outra redução. “Naquele tempo não tínhamos lavouras como hoje, nem cidades imensas, fiação para energia ou comunicação de telefonia. Então um sinal de fogo sempre era visto como mensagem. Por isso havia técnicas para mandar dizer até mesmo não venham que estamos com doença grave na aldeia“, informa o coordenador do Memória, enquanto maneja um dos Archotes recém aceso no Tatarandê, o único altar de fogo (dos sete) encontrado dos Sete Povos. Pesquisas indicam que cada Altar dispunha de 10 archotes e que dependendo da mensagem se usava mais de um. Fumaça com três archotes, por exemplo, representava doença na aldeia. Já 10 archotes juntos eram sinal de festa de confraternização, convite. Cinco archotes era o perigo: bandeirantes caçavam índios para trabalhar nas lavouras paulistas. Além dos altares de fogo, haviam as Fontes Missioneiras, portanto a cultura se baseava na proteção dessas duas divindades: Água e Fogo. “Os antigos deixaram para os seus descendentes a importância desses elementos. Nada vai substituir nunca a água e o fogo”, encerra Valtinha.

A programação noturna em São Miguel é dentro do Parque das Missões, onde a saga daquele povo que chegou a construir uma das mais ricas civilizações em termos de cultura e humanidade, no mundo, é contada. O espetáculo Som & Luz, que acontece todas as noites, age como uma catarse, às almas mais sensíveis, com falas, clarões e sombras revivendo dias gloriosos e a derradeira batalha. São versões em Português, Inglês e Espanhol. Para assistir é bom informar-se: espetáculo som e luz.

Uma vez nas Missões, não há como fugir das tradições dos Guaranis. Para quem dispõe de tempo, pode agendar uma visita na aldeia mais próxima, distante 30 quilômetros da sede do município, a Aldeia Alvorada recebe grupos agendados e mostram sua cultura. Pode-se ver a feitura do artesanato e ouvir um coral Guarani. O agendamento é feito pelo Aniceto 55.984225861 ou Pascoal 55.996044677.

Sem tempo para ir muito longe, visitei dona Alzira, no centro da cidade, e recebi uma benzedura. Pois as benzedeiras das Missões tem muita fé e dona Alzira é miudinha, mas tem muita força nas suas rezas.

Nossos agradecimentos à equipe do IPHAN de São Miguel que nos orientou quanto ao uso de imagens feitas no Parque Histórico Nacional das Missões e Sítio Histórico de São Miguel. Dessa forma, informamos que as fotos aqui postadas não podem ser reproduzidas com fins comerciais.

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